Luiz Paulo Costa: escritor quer levar seus livros para dentro do Vicentina Aranha. Foto / SuperBairro

Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 45 anos. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.

Todos os domingos, ele monta seu “estande” na calçada do Parque Vicentina Aranha para encarar a missão de oferecer seus livros à população; gestora do parque diz que criou evento para escritores e outros produtores culturais

 

WAGNER MATHEUS*

Desde o mês de maio, quem passa pela rua Prudente Meireles de Morais, na Vila Adyana, saindo da avenida Nove de Julho e caminhando em direção ao Parque Vicentina Aranha, se depara com um velho conhecido de antigas –e de nem tão antigas– gerações da cidade. O jornalista e ex-vereador Luiz Paulo Costa está lá, firme, aos 80 anos de idade completados no dia 9 de julho, vendendo exemplares de seus livros mais recentes.

O que muita gente estranha é que Luiz Paulo está do lado de fora da grade do parque, na calçada, e não dentro, como seria de se esperar em razão do produto cultural que ele oferece às pessoas. O escritor leva ao local uma mesinha e uma cadeira e, devidamente sentado, conversa com a gente que passa, sejam velhos conhecidos, sejam pessoas atraídas pela sua presença.

Artesanato?

Segundo Luiz Paulo, ele já esteve do lado de dentro do parque. Em meados de setembro do ano passado, participou da oitava edição da Flim (Festa Literomusical de São José dos Campos), onde ganhou um lugarzinho em um grande quiosque ocupado por dezenas de autores regionais.

Gostou tanto da experiência que procurou o advogado Aldo Zonzini, presidente da Afac, a organização social que faz a gestão do Vicentina, e sugeriu a abertura de um espaço no parque destinado aos escritores da cidade e da região do Vale do Paraíba. Pensou em usar o mesmo espaço da feira de artesanato realizada todos os domingos.

Porém, segundo ele, a reação à proposta não foi favorável. “Disseram que livro não é artesanato”, conta. “Mas o meu livro é artesanato, sim. Eu escrevo, lanço, divulgo, vendo e ainda solto rojão para comemorar”, brinca o escritor.

Luiz Paulo ainda não desistiu da ideia de poder apresentar e vender seus livros no parque. Ficou sabendo que estaria sendo preparado um edital para permitir esse tipo de produto cultural. “Estou de olho nesse edital”, avisa. [Veja nota no final deste texto.]

Outra possibilidade vislumbrada por ele é o café e bistrô aberto recentemente em um dos pavilhões do parque. “Café tem tudo a ver com leitura, quem sabe a gente possa expor livros ali como uma opção para os frequentadores”, imagina.

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Nasce o jornalista

Luiz Paulo Costa é joseense, filho de um músico famoso na cidade, o violonista Bem Costa. Morou durante 34 anos no centro antigo da cidade, na Vila Maria. Depois, mudou-se para o Jardim das Flores, no distrito de Eugênio de Melo, onde ficou por 15 anos. Há cerca de um ano, está vivendo em um apartamento da rua Santa Clara, na Vila Adyana, bem próximo da efervescência do centro expandido da cidade.

Depois de iniciar carreira como jornalista, passando pelo jornal “ValeParaibano” e depois pela histórica revista “Realidade”, onde participou da equipe que conquistou um “Prêmio Esso” –o “Oscar” do jornalismo brasileiro na época–, Luiz Paulo viu-se envolvido no clima político instalado no país com o regime militar, que iria interromper sua atividade jornalística em meados da década de 1970.

Prisão e tortura

Luiz Paulo foi preso por duas vezes. Na primeira, passou uma temporada no navio-prisão Raul Soares, fundeado na costa da cidade de Santos. Na segunda prisão, foi parar no DOI-Codi, sigla para o Destacamento de Operações de Informações do Centro de Operações de Defesa Interna, órgão do II Exército em São Paulo, onde foi barbaramente torturado, escapando por pouco da morte e sendo jogado de um camburão, após o período de prisão, em uma rua de São José, onde ficou até ser resgatado por familiares. Iniciou um longo tratamento das sequelas contraídas naquele período, algumas presentes até hoje.

As histórias da prisão e tortura estão contadas em detalhes no seu sétimo e mais recente livro, “A Cadeira do Dragão”, lançado em 2022. O título se refere a um instrumento de tortura ao qual o preso era atado para receber choques elétricos em todo o corpo.

Assim que conseguiu recuperar-se parcialmente do período que passou na prisão, Luiz Paulo ingressou na carreira política, participando do MDB (Movimento Democrático Brasileiro), partido que fazia a oposição possível ao regime militar da época. Eleito vereador em 1976, passaria os 20 anos seguintes como um dos mais produtivos e combativos membros da política local.

O livro mais recente de Luiz Paulo conta suas prisões e as torturas sofridas durante o regime militar. Foto / SuperBairro

Nasce o escritor

Ainda na atividade como vereador, Luiz Paulo começou a envolver-se em uma terceira carreira, a de escritor. Segundo ele, tudo começou devido ao mandato político. “Prometi aos meus eleitores que iria escrever para prestar contas do meu mandato, e daí surgiu, em 1982, ‘Na Luta Pelos Direitos do Povo’, meu primeiro livro”, explica. A obra teve prefácio do então governador de São Paulo, Franco Montoro, político que Luiz Paulo admirava.

Em seguida, vieram “Corrupção – A Câmara no Banco dos Réus”, em 1992; “Histórias & Estórias de São José dos Campos”, livro de crônicas lançado em 2005; “Álbum de São José dos Campos por Sérgio Weiss”, escrito junto com a filha Juliana Costa, também jornalista, em 2010; “A Sua Benção, Chico Triste”, em 2015; e a segunda edição de “Histórias & Estórias”, em 2017.

Hoje, o velho jornalista e ex-vereador acha que chegou a hora de fazer essas histórias chegarem ao maior número de pessoas. “O Vicentina Aranha recebe um público que gosta de livros. Vendo entre oito e dez livros por semana”, conta, orgulhoso. “Preciso vender porque paguei a gráfica e, com as vendas, reponho o que investi.”

Luiz Paulo não pretende desistir da sua missão de todos os domingos. Só não sabe se continuará sendo do lado de fora ou se irá ultrapassar as grades do Parque Vicentina Aranha.

Final feliz?

Antes de publicar este texto o SuperBairro entrou em contato com a assessoria de imprensa da Afac e, segundo a organização, o parque criou um evento mensal para esse público, a Feira de Livregrafia. Diz a nota:

“A tradicional Feira de Livregrafia é uma das iniciativas promovidas pela Afac para incentivar a arte impressa regional em suas diferentes linguagens. Ela acontece mensalmente e em grandes eventos do Parque Vicentina Aranha, reunindo expositores regionais independentes para a comercialização de suas produções, tais como: livros, zines, revistas, quadrinhos, fotografias, colagens, desenhos, gravuras, catálogos, postais, pôsteres, ilustrações, xilogravuras e toda uma infinidade de obras impressas que carregam características desse tipo de produção, como menor tiragem, alto valor artístico e conceito artesanal.

O credenciamento para a Feira de Livregrafia está aberto no site da Afac: https://afaccultura.org.br/editais.php. Podem se inscrever, até 31 de janeiro de 2024, artistas visuais, escritores, fotógrafos, coletivos, pequenas editoras, selos editoriais independentes, entre outros, que atendam os critérios estabelecidos no Ato Convocatório.”

O SuperBairro irá voltar ao assunto.

 

*Wagner Matheus é jornalista e editor do SuperBairro.

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