Mayakovsky e Caetano. Fotos / reproduções

Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 45 anos. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.

Poema O Amor (original)

Um dia, quem sabe,

ela, que também gostava de bichos,

apareça

numa alameda do zoo,

sorridente,

tal como agora está

no retrato sobre a mesa.

Ela é tão bela,

que, por certo, hão de ressuscitá-la.

Vosso Trigésimo Século

ultrapassará o exame

de mil nadas,

que dilaceravam o coração.

Então,

de todo amor não terminado

seremos pagos

em inumeráveis noites de estrelas.

Ressuscita-me,

nem que seja só porque te esperava

como um poeta,

repelindo o absurdo quotidiano!

Ressuscita-me,

nem que seja só por isso!

Ressuscita-me!

Quero viver até o fim o que me cabe!

Para que o amor não seja mais escravo

de casamentos,

concupiscência,

salários.

Para que, maldizendo os leitos,

saltando dos coxins,

o amor se vá pelo universo inteiro.

Para que o dia,

que o sofrimento degrada,

não vos seja chorado, mendigado.

E que, ao primeiro apelo:

– Camaradas!

Atenta se volte a terra inteira.

Para viver

livre dos nichos das casas.

Para que doravante

a família seja

o pai,

pelo menos o Universo,

a mãe,

pelo menos a Terra.

 

Vladimir Mayakovsky (nasceu a 19 de julho de 1893 em Baghdati, Geórgia, e morreu em 14 de abril de 1930 em Moscou, Rússia), em seus 36 anos de vida, foi considerado “o poeta da Revolução”. Além de poeta, foi dramaturgo e teórico russo. Ele é citado como um dos maiores poetas do século XX, inaugurando a escola futurista.

 

Poema O Amor

Caetano Veloso adaptado do poema de Vladimir Mayakovsky

Talvez

Quem sabe

Um dia

Por uma alameda

Do zoológico

Ela também chegará

Ela que também

Amava os animais

Entrará sorridente

Assim como está

Na foto sobre a mesa

Ela é tão bonita

Ela é tão bonita

Que na certa

Eles a ressuscitarão

O século trinta vencerá

O coração destroçado já

Pelas mesquinharias

Agora vamos alcançar

Tudo o que não

Podemos amar na vida

Com o estrelar

Das noites inumeráveis

Ressuscita-me

Ainda

Que mais não seja

Porque sou poeta

E ansiava o futuro

Ressuscita-me

Lutando

Contra as misérias

Do cotidiano

Ressuscita-me por isso

Ressuscita-me

Quero acabar de viver

O que me cabe

Minha vida

Para que não mais

Existam amores servis

Ressuscita-me

Para que ninguém mais

Tenha de sacrificar-se

Por uma casa

Um buraco

Ressuscita-me

Para que a partir de hoje

A partir de hoje

A família se transforme

E o pai

Seja pelo menos

O Universo

E a mãe

Seja no mínimo

A Terra

A Terra

A Terra

 

Caetano Emanuel Viana Teles Veloso (Santo Amaro da Purificação, 7 de agosto de 1942) é um músico, produtor, arranjador, cineasta e escritor brasileiro e dos mais premiados internacionalmente por sua vasta obra. Caetano Veloso tem 78 anos e continua em plena atividade. É um dos fundadores do movimento Tropicalista, que mudou o eixo da música brasileira.

 

> Júlio Ottoboni é jornalista (MTb nº 22.118) desde 1985. Tem pós-graduação em jornalismo científico e atuou nos principais jornais e revistas do eixo São Paulo, Rio e Paraná. Nascido em São José dos Campos, estuda a obra e vida do poeta Cassiano Ricardo. É autor do livro “A Flauta Que Me Roubaram” e tem seus textos publicados em mais de uma dezena de livros, inclusive coletâneas internacionais.