Retratado na parede, por longo tempo o baixinho da Kaiser teve presença marcante na minha garagem. Foto / Google/Reprodução

Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 45 anos. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.

Desde que a Fifa organiza a Copa do Mundo, a do Catar é a mais polêmica. As tretas são motivadas pelo desrespeito do governo catari às mulheres e minorias e às supostas mortes de imigrantes nas obras dos estádios para a competição.

Às vésperas do início do torneio, o presidente da Fifa, Gianni Infantino, deu um cala-boca nos críticos: quem não gostou, não assista! (aos jogos), disse. Com a bola rolando, aparentemente não se fala mais nisso.

No domingo (20), depois do pontapé inicial do jogo entre o representante da casa e o Equador, não restou dúvida sobre o que levou Joseph Blatter, ex-presidente da Fifa, a escolher, em 2010, o país do Oriente Médio como sede do Mundial de 2022: uma montanha de dinheiro. Só para as seleções participantes, serão distribuídos mais de dois bilhões de reais. Para o país-sede, prestígio, holofotes, dinheiro.

Sem ignorar que futebol e corrupção são irmãos siameses, vejo a Copa com entusiasmo. Acho que o Brasil também. Cadê o clima de Copa? –chiou outro dia o ex-jogador e comentarista esportivo Casagrande. Calma, Casão, espere o Brasil entrar em campo.

Vi um pedaço do embate inaugural. O Catar parecia um catado. No jargão futebolístico, catado é a formação, a toque de caixa, de um time para uma partida na várzea. A escolha dos atletas para o jogo é feita pelo técnico, também dono dos uniformes e da bola. Com o que mostrou, o Catar é figurante. Mas que importância tem isso se durante 28 dias o endinheirado país das arábias estará no olho do furacão?

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Aqui vale um parênteses. Achei graça de um meme no Facebook mostrando uma foto do emir do Catar ao celular concomitante ao jogo. Segundo o internauta, o grande líder –e quase deus– ligava para saber a chave pix do responsável pelo VAR, que analisava a jogada de um gol do Equador quando o placar ainda estava zerado. Tudo a ver, pensei.

Achei chocho o começo da Copa. Para quem teve o privilégio de ver memoráveis escretes canarinhos, talvez eu peça demais. O de 1970 foi o melhor de todos. Mais de 50 anos depois, tenho vivos lances incríveis daquela seleção. Como o de Pelé, num genial chute ao gol do meio do campo. A bola tirou tinta da trave, para alívio do goleiro tcheco Viktor, um pouco adiantado. Naquela edição, foram seis jogos, seis vitórias e 19 gols marcados pela seleção do Brasil. Um arraso!

A seleção de 1994, de Bebeto e Romário, foi igualmente icônica. Houve sofrimento, com o Brasil disputando o caneco nos pênaltis depois de um jejum de 24 anos. Chegar à final contra a Itália foi um feito e tanto para quem tinha desembarcado nos Estados Unidos desacreditada, após se classificar na bacia das almas nos jogos eliminatórios.

Depois de um empate sem gols, foi a primeira vez que se decidiu uma Copa do Mundo nos pênaltis. O final, todos conhecem: Baggio, então melhor do mundo, perdeu o último pênalti e o Brasil explodiu de alegria pela conquista do tetra.

Saudosismo à parte, uma semana antes da bola rolar em 94, o clima de Copa do Mundo era latente e contaminava o Brasil. Na minha rua, bandeiras decoravam fachadas e janelas, bandeirinhas de cores verde e amarela pendiam sobre a cabeça dos passantes, o asfalto exibia o caminho para se alcançar a tão cobiçada taça… enfim, uma festa de boas energias para os nossos canarinhos na terra do Tio Sam.

Foi quando os meus filhos Lucas e Carlinhos, então bem jovens, resolveram aderir àquele clima. Sem tempo, deixei aos cuidados dos dois a iniciativa do adorno. Tive bela surpresa! Eles tinham pintado na parede do fundo da garagem um jogador de futebol. A figura de quase três metros de altura tinha boa caracterização, com uniforme da seleção e bola sob um dos pés, mas rosto e abdômen demasiado cheios. Quis saber quem estava retratado ali.

– É o baixinho Romário –disse o Lucas, perguntando se eu tinha gostado.

– Gostei. Só achei o Romário meio gordo para um atleta profissional que quer ser campeão do mundo –, respondi.

Lucas concordou e achou, como eu, estranha a barriguinha do Romário. O que fazer?

– Dê-lhe um pouco mais de barriga, coloque nele uma boina e um bigode, e vamos transformá-lo no baixinho da Kaiser, sugeri, aludindo ao personagem do anúncio da cervejaria.

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No dia seguinte o baixinho Romário tinha virado o baixinho da Kaiser, que ficou famoso no meu pedaço. O retrato ficou ali até depois da Copa seguinte, virando referência para quem me procurava ou a um de meus familiares.

Quer saber onde mora o baixista do grupo de música ou a mulher que vive a acudir os indigentes? Bata na casa que tem na parede um gordinho de bigode, indicavam os vizinhos.

Agora, sabedor de minhas inesquecíveis e marcantes Copas do Mundo, peço que você releve o desfecho desimportante (mas previsível) deste texto inicialmente sério. Nem vou me queixar se, por aqui, um diligente leitor me mandar catar coquinho no Catar.

Em tempo: a vitória do Brasil sobre a Sérvia, no seu jogo de estreia da Copa do Mundo, é um bom motivo para o brasileiro vestir as cores da Seleção Brasileira e torcer. O hexa é logo ali!

 

> Carlos José Bueno é jornalista profissional (MTb nº 12.537). Aposentado e no ócio, brinca. Com os netos e as palavras.

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