Foto / Pixabay

Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 45 anos. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.

Devidamente molhado pelas abundantes águas de março, que ainda não fecharam o verão, cheguei à casa e me deparei com a rabugice da tia Filoca, falando de chofre e toda esbaforida:

− Ah, Zezinho, estava esperando você chegar! Precisa me ajudar com essa ramaiada toda. Você sabe que, na Semana Santa, sobra sempre pra mim isso de preparar tudo para a bênção dos ramos. Tenho de arrumar as folhas de palmeira, deixar bem limpas e cortadinhas. Além das velas e tudo mais. Onde é que já se viu ir a essa missa sem levar ao menos um raminho? Ufa, estou cansada!

De fato, a tia era o –digamos– zeloso apoio logístico da nossa família na fé católica, com ranhetice e tudo. Eram os ramos, velas, copinhos de velas e o mais para a procissão e missas. Até convocava gente para ajudar, no Corpus Christi, a execução daqueles belos tapetes coloridos, cheios de pó de café, serragem, recicláveis, flores e tudo para formar desenhos interessantes. Quando não empurrava as crianças para ser coroinha.

O rito de abençoar os ramos é antigo na igreja cristã, remonta ao século três ou quatro, começando na Espanha. O simbolismo dessa festa, algo parecido com uma antiga festa hebraica, tinha a alegria como característica. Na cristã, é a entrada triunfante do Messias, porém com humildade, num burrinho todo enfeitado, o povo lançando suas roupas pelo caminho e ramos de palmeira, para pavimentar e festejar a vinda dele a Jerusalém “Daquele que há de vir em nome do Senhor” e nos conduzir ao Reino de Deus. Considera-se também como o dia do perdão.

Hoje, em São José dos Campos, na paróquia da Sagrada Família da Vila Ema, faz-se a benção dos ramos na igreja, sai a procissão curta em volta do quarteirão, retornando ao templo. Os fiéis guardam as palmas bentas em casa, atrás da porta; só se desfazem delas na época seguinte, queimando a palha seca.

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Por falar em ramos, ritos antigos católicos e costumes populares, lembro-me de muitos anos atrás, voltando de viagem a Portugal, sofri com o tal ramo. Era época da Semana Santa e o bendito português que voltava ao Brasil simplesmente trouxe junto dele, na poltrona, não uma mala de bordo, senão um vaso com uma palmeira exuberante. Não é preciso dizer que os ramos da palmeira vieram me cutucar durante as tormentosas dez horas de voo, em apertadas poltronas da classe econômica. Batiam no meu olho, roçavam no braço, enfim, reclamei sem resultado −a companhia era a TAP. Acabei pegando uma implicância com as palmas, por um tempo, é claro.

Tia Filoca, ao saber, reagiu bem a seu estilo:

− Fosse comigo… Não vou nem falar o que faria com essa planta! O patrício e a aeromoça iam ver só comigo! Vai ver que ela era uma dessas aerovelhas!

− Não, tia, menos. Na realidade não era aeromoça nem muito menos aerovelha, mas sim comissária de bordo. A idade não importa.

Não guardo rancor de ninguém do episódio, nem da companhia. Muito menos do teimoso e sem noção irmão português. Restou apenas a parte exótica e humorística de uma viagem em que a tia não estava presente. Sorte deles…

 

> José Roberto Fourniol Rebello é formado em direito. Atuou como juiz em comarcas cíveis e criminais em várias comarcas do estado de São Paulo. Nascido em São Paulo, vive em São José dos Campos desde 1964, atualmente no Jardim Esplanada. Participou do movimento cultural nascido no município na década de 60.

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