Jogadores do Brasil comemoram o título de 1958. Foto / europeanway.com.br/Reprodução

Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 45 anos. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.

O cachorrinho da minha filha saiu correndo como louco, alucinado diante da estridência de uma vuvuzela nas suas orelhas. Além dos gritos de alegria na sala, tudo piorado com os rojões espoucando lá fora. Um inferno para o animal, que foi se esconder debaixo da cama depois do primeiro gol da Copa do Mundo do Catar. Foi duro achar o coitado do Bob.

Mau momento para os pets, alegria de quase todos nessa época de festa nacional do futebol.  Isto me faz lembrar das copas do mundo que vivi; já foram a maioria delas, acredite. Das primeiras, de 1950 e 54, não tenho nem lembrança, pois não tinha idade para isso nem havia a riqueza midiática de hoje. Mas a de 1958, nossa primeira vitória, escutei pelo rádio, já adolescente, e vi o Brasil explodir de contentamento.

Se bem que acompanhar, sem imagem, os jogos de futebol na época, era um desafio. O bendito rádio, fazendo aquele assobio de fium quando mudava de estação, era uma chiadeira só. Às vezes o som ia sumindo e ficava nesse aumenta-diminui. No mais das vezes apenas dava para entender quando o locutor gritava gol.

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O aparelho lá de casa −uma velha caixa amarela de madeira que ficava em cima da cornija da lareira− foi meu primeiro contato com a Copa e ficamos maravilhados com Garrincha e Pelé. Contudo, só de ouvir. Tínhamos de nos contentar com as descrições dos jornalistas e fotos na imprensa escrita. Ver, efetivamente, apenas vimos muito tempo depois em filmes incompletos, apenas lances.

Porém, lembro-me com prazer das músicas que fizeram sucesso, como em 1958: “A Copa do Mundo é nossa, com o brasileiro não há que possa…”. Ou em 1962, na voz de Jackson do Pandeiro: “Vocês vão ver como é, Didi, Garrincha e Pelé dando o seu baile de bola…”. Já em 1970 foi o bom hino do jornalista e compositor Miguel Gustavo, vitorioso em concurso: “Noventa milhões em ação, pra frente Brasil, do meu coração…”. Era o estilo exaltação do país do “ame-o ou deixe-o”, no entanto todos cantavam emocionados, para nós, do povo, não havia o viés político.

Os tempos mudaram, mas a emoção é a mesma, pura, quase infantil. Acredito que a Copa do Mundo é sempre uma época de fuga dos problemas que nos afligem, refúgio momentâneo na banalidade gratificante do futebol. Eu me arrisco a dizer que é até gostoso acompanhar, neutro, as partidas dos nossos adversários, sem o desgaste da emoção e do sofrimento de torcida.

O que importa é sentir como foi bom ganhar cinco Copas, mesmo acompanhar aquelas até o momento em que perdemos! Note-se que esse bendito futebol foi quem começou a melhorar a autoestima do brasileiro, a começar na Suécia, naquele distante junho de 1958. Finalmente éramos os melhores em alguma coisa!

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As comemorações da Copa do Mundo −como do futebol em geral– se revelam um verdadeiro desabafo do torcedor, mesmo o bissexto, espanando as frustações em geral, algumas vezes num processo catártico, a purgar doloridas derrotas anteriores, como as de 1950 e de 1982. Nada como a gritaria, beijos e abraços, muita cerveja, bandeiras e roupas, além do indefectível carnaval que se segue, unindo todos numa confraternização. Aqui em São José dos Campos, toca para a avenida Nove de Julho, ponto tradicional de festejos, notadamente futebolísticos.

Se não ganhar –e para nós brasileiros só vale o primeiro lugar–, resta a esperança para a próxima Copa do Mundo e meter o pau à vontade no técnico e jogadores, numa costumeira caça às bruxas. E toca a guardar camisas, bandeiras, apitos e vuvuzelas bem no fundo do baú. Pelo menos até daqui a quatro anos, quando outra alienação benigna vem ajudar na manutenção de nossa sanidade.

 

> José Roberto Fourniol Rebello é formado em direito. Atuou como juiz em comarcas cíveis e criminais em várias comarcas do estado de São Paulo. Nascido em São Paulo, vive em São José dos Campos desde 1964, atualmente no Jardim Esplanada. Participou do movimento cultural nascido no município na década de 60.

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