Ilustração / Pixabay

Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 45 anos. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.

Quanto mais velho eu fico, mais velho eu me sinto.

Parece óbvio, mas não é tanto assim. A constatação não tem nada a ver com a idade cronológica ou com as dores naturais nas costas e, por que não, no restante do corpo. O maior problema de um velho nos dias de hoje é conviver com os jovens dos dias de hoje.

É simplesmente impossível achar normal o que essa gente faz. E eu não estou falando de gente de 15 a uns 25 anos, que era o que, na minha época, se convencionava chamar de jovem. Hoje em dia, é comum a juventude se entender até os 30 anos, ou, por que não, até os 35, 38 e por aí vai. Ninguém quer ser adulto, maduro, idoso. Parece que todos estão sempre “na flor da idade”.

Não é o meu caso. Tenho, no meu perfil do Facebook, 4.976 amigos, que é o nome que se dá às pessoas que aceitaram a minha amizade nessa grande rede social. Cheguei quase ao limite de 5.000 amigos que o Facebook aceita em um perfil.

O que me chama a atenção nesse grupo de 4.976 pessoas é que, aparentemente, ninguém é velho. Parece que todo mundo está vendendo saúde, frequentando os melhores restaurantes, bebendo os vinhos mais refinados, enfim, curtindo o que a vida tem de melhor. Ou seja, parece que eu não tenho amigos velhos, apesar de estar com 65 anos, a menos de um mês de completar 66.

Porém, eu pego esse pessoal engraçadinho de surpresa quando, diariamente, cumpro uma rotina que me acostumei a seguir: cumprimentar os aniversariantes. É verdade, faz anos que costumo enviar os parabéns a todos os meus amigos de Facebook. Acho natural que, sendo pessoas que, de uma forma ou de outra, agreguei ao grupo, eu deva lembrar do dia em que esse pessoal fica mais velho.

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E aí vem a minha grande surpresa, na verdade, um grande susto. Posso dizer que, a cada dez amigos nessa rede social, entre sete e oito estão acima dos 60 anos. Quando descobri este fato, fiquei aterrorizado. Como pode ser isso? Eu sou um cara moderno, antenado, sintonizado com tudo o que acontece, com posso ter tanto amigo velho? Resposta: “Aceita que dói menos”.

Diante dessa constatação inquestionável de que o tempo passa, “o tempo voa e a poupança Bamerindus continua numa boa” –lembra disso? rsrs…–, ninguém pode brigar com os fatos. Sou velho e acabou. Ponto final.

Aí você vai perguntar por que eu entrei nessa historinha de idade, de Facebook e da necessidade de aceitação dos fatos da vida. Explico: no mundo de hoje, ninguém aceita nada que não seja o que quer aceitar. Tipo assim: eu não quero ser velho, então me recuso a aceitar que os amigos de Facebook que atraio são velhos iguais a mim. Prefiro me enganar pensando que a maioria é gente até uns 30 e poucos anos, sem falar nas menininhas de 18, 20, 22…

Aliás, foi bom chegar nesse ponto. Aprendi que, quando vem uma solicitação de amizade de pessoa do sexo feminino com menos de 25 anos de idade, eu posso recusar quase imediatamente: é golpe. Adquiri prática nisso. Já me cansei de receber essas solicitações de mocinhas bonitas, quase adolescentes –a grande maioria postando lá do Rio Grande do Sul–, que mostram fotos desinibidas e me tratam como um garotão.

Quem fica assanhado com isso e estimula o contato vai ter uma bela surpresa na sequência. A mocinha vai mostrar fotos mais desinibidas ainda, vai pedir que o “garotão” se mostre também, e o final da história vai ser uma chantagem com ameaça de enviar os nudes para a família dele. E assim a festa termina com final muito infeliz.

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Imaginei que as bobagens de hoje nas redes sociais envolvendo a vontade de se dar bem tivessem acabado nesses exemplos. Porém, uma notícia/fofoca que li há alguns dias me deixou abismado com o ponto a que Facebook e congêneres nos levaram. Veja só…

Um ex-garotão carioca, rico, filho de gente famosa, se acostumou aos elogios fáceis que a juventude atrai, do tipo “lindo, gato, maravilhoso, garanhão, tesão” etc. etc. Era o melhor dos mundos para o cara chamado Thor Batista, filho do casal Eike Batista e Luma de Oliveira –sim, aquela que usou coleira com o nome do maridão em um desfile de Carnaval.

Pois é. O que mudou nessa história é que o tempo passou, Thor ficou mais velho, pra lá dos 30 anos, a cintura aumentou, os cabelos ficaram ralos e ganharam uma entrada proeminente, algumas olheiras ficaram mais visíveis, e o inevitável aconteceu: as redes sociais trataram o Thor –antigo deus viking no imaginário da família e dele próprio–, com um adjetivo desconfortável: feio.

Sim, é isto mesmo: feio. E você há de concordar, no mundo de hoje, em que ninguém quer ser velho, antipático, doentio, derrotado, ninguém admite ser feio. Muito menos o Thor, menino nascido no berço de ouro de um dos caras mais ricos do mundo –depois, como se sabe, o mundo do pai desabou.

O Thor Batista teve a cara de pau de ameaçar com processo todas as pessoas que o chamarem de feio nas redes sociais. É isto mesmo que você leu, não pode chamar o rapaz de feio. E o feio –ops, desculpa aí– ainda deu a desculpa de que os processos visarão proteger a imagem do filho que está com ele na foto que gerou toda a confusão. É bom explicar que a criança na foto, que ele leva ao colo, é quase um recém-nascido que não está de frente na imagem, só aparece a nuca da criancinha. Esta é a imagem que o Thor quer proteger. Uma nuca.

Fico pensando no que diria o grande dramaturgo e jornalista Nelson Rodrigues, morto em 1980 depois de uma obra extensa e maravilhosa, se estivesse vivo hoje e tomasse conhecimento do mimimi do Thor. Iria detonar o rapaz sem a menor piedade. Vindo de um mundo de feios, doentes, famintos e complexados das primeiras décadas do século 20, Nelson não iria admitir a rejeição da feiúra por quem é feio.

Imagine você, caro leitor, se todo feio –ou toda feia– resolver proibir de ser chamado de feio ou feia. Pior, processar os seus “detratores” e, provavelmente, querer ser ressarcido em dinheiro pela ofensa recebida.

Que mundo é esse em que vivemos?

 

Em tempo: podem me chamar de velho, eu sou; se quiserem me chamar de feio, chamem também, mas minha mãe não vai concordar. Quanto a mim, não estou nem aí.

 

> Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 48 anos. É editor do SuperBairro. Mora na Vila Guaianazes há 23 anos.

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