Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 45 anos. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.

Ia caminhando pelas ruas da cidade, dia destes, tranquilo e sereno, quando me deparo com o amigo Jonas, a quem não via desde muitos anos atrás. Ele sempre entrosado na política partidária, apaixonado nas suas convicções ou interesses. No mínimo, uma figurinha difícil.

Após calorosos cumprimentos, o moço –se assim se pode dizer dele, já bem entrado nos anos, como diz o caipira–, confidenciou-me de chofre, expressão contrita:

– Zé, você não sabe! Estou perdidamente apaixonado! Não sei mais o que faço. Acordo, já penso nela. Ligo, bato um papo, passa um tempo, volto a conversar, várias vezes no mesmo dia. Não consigo ficar distante! Uma loucura!

– E a menina? – indaguei. É uma mocinha, não? Conheço você. Ela corresponde a esse amor todo?

– Sim, Zé, mas não é esse o problema, não.

E fez uma cara estranha, parecia constrangido em revelar, hesitante. Sentou-se num banco da praça e curvou-se para frente, com a cabeça entre as mãos. Passado um longo e desconfortável minuto, finalmente ele levantou a cabeça e começou a explicar:

– Eu me apaixonei pela mulher mais linda do mundo, mas ela é professora pela internet de um curso de inglês. Você fala e ela responde, uma gracinha, precisa ver aquele rostinho, aqueles lábios carnudos.

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Fiquei atônito e, antes que ele continuasse com detalhes escabrosos, o que consegui dizer foi o seguinte:

– Você quer dizer que se apaixonou por um robô, Jonas? Não acredito! Você está completamente louco ou quer folgar comigo. Fui!

Deixei-o ali, parado na praça e o bendito com aquele olhar de pierrô apaixonado. Um camisolão!

Cheguei em casa e caí na besteira de contar o episódio à tia Filoca. Ela ficou só escutando, quieta.

Falei da situação esdrúxula, para dizer o menos, do mundo virado de cabeça para baixo. Fiz ver que eu via tudo como um perigo para a Humanidade, nas mãos do que hoje no mundo novo da inteligência artificial chamam de chatbot ou assistente virtual, parceiro de conversa pela internet. Mostrei meu temor pelo perigo em não se cuidar bem dessas novidades tecnológicas, como a IA, enfim, discorri longamente a respeito dos sinais dos tempos e do sucumbimento do homo sapiens pelas máquinas.

Quando parei, aí veio a tia Filoca de sempre:

– É, Zezinho, é o que dá esses seus amiguinhos malucos, você se dá com todo mundo! Eu sei quem é esse estafermo do Jonas. É um comunistinha! Se não é, é um desprezível fascista! Tudo farinha do mesmo saco radical. Agora estão ficando loucos, bem-feito! Isso de tanto ódio destilado, nessa insana polarização. Acaba com o país! Nem me fale desse maldito populismo, de esquerda e de direita! No meu tempo chamava-se demagogia. Ah, se pego um maluquete desse tipo eu sapeco logo meus tamancos no bruto, sem dó nem piedade! E paixão por mulher robô? Passa amanhã!

Fourniol Rebello. Foto / SuperBairro

José Roberto Fourniol Rebello é formado em direito. Atuou como juiz em comarcas cíveis e criminais em várias comarcas do estado de São Paulo. Nascido em São Paulo, vive em São José dos Campos desde 1964, atualmente no Jardim Esplanada. Participou do movimento cultural nascido no município na década de 60.

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