Este não será um artigo de autolouvação, prometo. Será apenas o registro de um objetivo atingido. Neste dia 15 de outubro completo 50 anos de carreira como jornalista. E decidi comemorar com você que está lendo este texto agora.
Na verdade, não me lembro se a data correta é o dia 15, mas escolhi a metade do mês porque foi por volta disso que participei do lançamento de um jornalzinho em Caçapava batizado de “Pop News”. Era um tabloide quinzenal que tinha como pretensão levar o jornalismo moderno à pequena Cidade Simpatia.
No “Pop News”, dada a precariedade da época e dos meios, acumulei durante algum tempo funções na venda de publicidade e também de colunista e um dos revisores. Era uma época em que tudo era difícil. Quem tinha uma máquina de escrever razoável podia se gabar de possuir quase uma Redação; quem tinha uma linha de telefone, imaginava-se conectado com o mundo, apesar da péssima qualidade das ligações; quem conseguia pegar um ônibus ou uma carona até o local dos fatos, podia considerar-se um repórter vitorioso.
Isto sem falar na prova de fogo que ocorria a cada 15 dias: levar o jornal até a gráfica para o doloroso processo de fotocomposição dos textos, confecção dos fotolitos das fotografias e ilustrações, montagem de tudo em páginas, revisão de tudo, fotolitos de tudo e impressão em uma rotativa veloz. Saía-se de casa sem dia e hora para voltar. E a tiragem era tão pequena que bastavam uma ou duas aceleradas na moderna máquina e depois frear rapidamente até a parada final.
A gráfica ficava em São José dos Campos. Eram –e ainda são– meros 22 quilômetros de distância, mas, como disse Louis Armstrong uma vez, era “um pequeno passo para um homem, mas um salto gigantesco para a humanidade”. O que eu quero dizer é que, naquela metade dos anos 70, a modesta Caçapava “ficava” a pelo menos 300 quilômetros da moderna São José, a cidade que ostentava placas enormes nos seus limites na Via Dutra, garantindo que seguia “os passos do gigante”. Gigante, no caso, devia ser o Brasil do regime militar, mas ninguém era perfeito, nem mesmo São José.
Após este breve suelto –como definia um famoso jornalista da época da gigante São José para referir-se a uma nota de coluna– posso dizer que a minha carreira foi em frente, com muitos jornais, muitos empregos, muitas demissões, muitas vitórias, muitas derrotas, mas sempre com muita vontade de fazer. Não sei por que trabalhei tanto. O fato é que sempre me senti conduzido por uma espécie de piloto automático que me impedia de parar, de reduzir a marcha ou de recusar propostas de empregos e clientes, de onde quer que viessem.

Eu diria que foi uma carreira vitoriosa no Vale do Paraíba, mas que se manteve algo provinciana porque, como jornalista, carreguei nos primeiros anos uma marca de nascença não muito apropriada: a de jornalista sem registro profissional. Isto me levou a ser altamente competitivo no mercado de trabalho local e regional, mas bloqueado em outros mercados nos quais havia uma fiscalização mais rigorosa do então ativo Sindicato dos Jornalistas.
Por que não cursei faculdade de jornalismo? Explico. Cheguei ao Vale do Paraíba aos 17 anos de idade e, na época, não havia curso superior de jornalismo na região. Ou estudava em São Paulo ou em Mogi das Cruzes. E eu, já empolgado com a carreira, já empregado com carteira assinada, não via nenhuma vantagem em perder três ou quatro horas todos os dias, durante quatro anos, para frequentar uma faculdade. Preferi pisar no acelerador e usar essas horas “cursando” as redações e produzindo jornalismo.

Na verdade, os grandes professores de jornalismo da época não estavam nas faculdades, estavam nas redações. Com eles, os jovens aprendiam bastante no dia a dia. Por isso, não me arrependo da decisão, apesar de ter reduzido o meu espaço geográfico de atuação. Só iria conseguir o registro profissional em 1982, com a comprovação de atividade junto ao Ministério do Trabalho graças a uma nova lei que entrou em vigor naquele ano, mas aí já havia me acomodado no mercado local, onde sempre me senti bem e onde, reconheço, fui bastante valorizado.
Mesmo assim, pude trabalhar como correspondente em São José e no Vale do Paraíba de alguns dos maiores jornais do país, como “O Estado de S. Paulo”, “Jornal da Tarde”, “Folha de S.Paulo”, “Diário Popular”, até no “O Globo” publiquei cobrindo férias de um companheiro. Fez bem para o ego participar de uma época importante da imprensa brasileira, a da retomada da democracia.
Voltando ao início deste texto, chego aos 50 anos de trabalho como jornalista e, conforme você talvez saiba, como editor deste portal de notícias, o SuperBairro, que completa cinco anos em março do ano que vem. Este meio século me encontra já aposentado pelo INSS, porém com vontade de continuar escrevendo.
Mas como querer nem sempre é poder, a saúde física e emocional está me mandando a conta e recomendando que eu desacelere, mesmo sem parar de uma vez. É o que pretendo fazer. E é por isso que, daqui por diante, pretendo mergulhar ainda mais o SuperBairro no projeto de jornalismo hiperlocal para o qual ele foi criado.
Vou me dedicar aos assuntos cotidianos desses 36 bairros e vilas do Centro expandido e parte da região oeste, além de manter um time de colunistas e articulistas do qual pretendo continuar fazendo parte. Parar completamente, jamais. Quer dizer, parar só quando for parado pelo “editor-chefe” que está lá em cima.
No SuperBairro, tenho tido o prazer de opinar, analisar e interpretar sobre o que considero relevante. Com isso, já produzi 189 textos, entre artigos e crônicas, onde tenho um feito uma espécie de strip-tease para o leitor, me mostrando por inteiro. Clique [aqui] e tenha acesso a todos os textos.
Pretendo, nesta sobrevida de carreira, produzir também algumas colunas relembrando fatos e casos que vivi nestes 50 anos. Penso que assim contribuo, mesmo que modestamente, para que uma parte da história da imprensa de São José e região não caia no esquecimento.

Para terminar, quero dizer que gostaria que estas gerações que estão sucedendo à minha, apelidada de geração de jornassauros, sejam tão felizes e realizadas como eu fui nestes 50 anos. Posso dizer que fiz jornalismo para quem gostava de ler notícias e, sobretudo, entendia a missão da imprensa.
Já que sou chegado em citações, segue aí a retirada de um pagode para resumir este ponto de chegada:
“Deixa a vida me levar
Vida leva eu
Sou feliz e agradeço
Por tudo que Deus me deu”
(Seu Jorge e Zeca Pagodinho / 2012)
P. S. – No lançamento do SuperBairro, em 22 de março de 2021, escrevi um artigo, com o título de “Um tributo ao jornalismo”, no qual sou mais detalhista em relação à minha trajetória profissional. Se tiver interesse, clique [aqui].

> Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 50 anos. É editor do SuperBairro. Mora na Vila Guaianazes há 24 anos.
